Várias substâncias químicas existem na natureza na forma de gases. Os exemplos mais imediatos estão ao nosso redor, nos mantendo vivos: o ar atmosférico é principalmente formado por nitrogênio (N2), oxigênio (O2), argônio (Ar)argônio-ar; ele também tem outros gases em menores quantidades: dióxido de carbono (CO2), vapor de água (H2O) são produtos da nossa respiração, por exemplo.
Outros gases são industrialmente importantes: o hidrogênio (H2) é usado em diversas reações químicas, como na produção de amônia (NH3), um gás muito utilizado na fabricação de fertilizantes; a produção do ácido sulfúrico (H2SO4) envolve o gás dióxido de enxofre (SO2).
Dos três estados mais comuns da matéria, o gasoso é aquele em que o material não tem forma nem volume fixos (o recipiente onde você põe um gás vai ser totalmente ocupado por ele, independentemente do formato ou tamanho). Os gases tendem a se expandir (ocupar mais espaço) quando permitidos, mas também podem ser confinados e comprimidos até certo ponto e se contraírem (ocuparem menos espaço).
Para estudarmos o comportamento dos gases, é bom recapitular algumas propriedades importantes deles.
O comportamento de um gás está relacionado às condições que ele está, que são coletivamente chamadas de “estado” do gás. Três grandezas que definem o estado de um gás são o volume, a temperatura e a pressão (que costumam ser chamadas de variáveis de estado do gás).
O volume (V) de um gás é uma medida do espaço que ele ocupa: quanto mais espaço, maior o volume. Quando um gás aumenta de volume, dizemos que ele expandiu; quando diminui, ele contraiu.
O volume costuma ser expresso em metros cúbicos (m3), decímetros cúbicos (dm3), centímetros cúbicos (cm3), litros (L) ou mililitros (mL). Um litro é o mesmo volume que um decímetro cúbico e, consequentemente, um mililitro é o mesmo volume que um centímetro cúbico. De acordo com os prefixos do SI e elevando a igualdade 1 m = 10 dm = 100 cm ao cubo, temos que:
1 m3 = 1 000 dm3 = 1 000 000 cm3
1 L = 1 000 mL = 1 dm3 = 1 000 cm3
A temperatura (T) de um gás é uma medida do quão rápido as partículas desse gás estão se movimentando: quanto maior a velocidade média dessas partículas, maior a temperatura do gás.
Na maioria dos países, a unidade comum para expressar temperatura é o grau Celsius (°C), e em alguns poucos é usado o grau Fahrenheit (°F); em aplicações científicas, e no SI, a unidade de temperatura é o kelvin (K).
\(T_\text{K} = T_\text{C} + 273\) 273
\(T_\text{F} = \dfrac{9}{5} \cdot T_\text{C} + 32\)
Nas relações acima, TC, TF e TK indicam o valor numérico da temperatura, em graus Celsius, em graus Fahrenheit e em kelvins, respectivamente.teta
A pressão (P) de um gás é uma medida da força que ele exerce para tentar se expandir, que vem das colisões das partículas do gás com as paredes do recipiente onde ele está: quanto maior essa força, maior a pressão do gás. Especificamente, a pressão é a intensidade da força aplicada dividida pela área de aplicação.
A unidade de pressão no SI é o pascal (Pa), que equivale à força de um newton aplicada numa área de um metro quadrado (N/m2). Outras unidades comuns para expressar a pressão de gases são a atmosfera (atm), o bar (bar) e o milímetro de mercúrio (mmHg):
1 atm = 760 mmHg = 101 325 Pa
1 bar = 100 000 Pa
A pressão atmosférica é a pressão que a atmosfera exerce na Terra, por causa do peso do ar. Ao nível do mar, ela tem o valor de 1 atm (= 760 mmHg), e esse valor diminui quanto maior for a altitude, já que diminui a massa de ar sobre aquela região (e, portanto, o peso exercido por ela).
O valor de 760 mmHg para a pressão atmosférica ao nível do mar foi determinado pelo matemático italiano Evangelista Torricelli, em 1643, com um tubo aberto em uma ponta e um recipiente, ambos contendo mercúrio (Figura ). Ao preencher o tubo com mercúrio e virá-lo no recipiente, parte do metal escoou, mas outra parte “estacionou” formando uma coluna de 760 mm acima do nível do mercúrio no recipiente. Como essa coluna se manteve em equilíbrio, a pressão exercida pelo ar sobre o recipiente é igual à pressão exercida por esses 760 milímetros de mercúrio.
Além de pressão, volume e temperatura, a quantidade de gás também define o estado de um gás. Por enquanto, nós não vamos abordar mudanças na quantidade de gás, mas vamos ver os resultados de vários experimentos feitos entre os séculos 17 e 18 que envolviam a mudança nas propriedades de quantidades fixas de gás. A ideia deles é manter uma propriedade fixa, seja a pressão, o volume ou a temperatura do gás, e manipular as outras duas para avaliar como elas estão relacionadas. Esses experimentos deram origem a leis científicas, que foram importantíssimas para ajudar a entender o que é um gás e como ele se comporta.
Para se obter algumas informações sobre a atmosfera da Terra, são usados balões meteorológicos, que flutuam no ar e levam equipamentos que vão registrar os dados. Esses balões são inflados com hidrogênio ou hélio, mas não saem do solo completamente cheios, porque ao subir pela atmosfera eles vão inflando, até uma hora se romperem.
Se ignorarmos mudanças de temperatura, podemos descrever essa transformação no balão levando em conta a relação entre pressão e volume. Ao manter uma quantidade fixa de gás a uma temperatura constante, é possível variar sua pressão ou seu volume; essa manipulação é chamada de transformação isotérmica.
Numa transformação desse tipo, o que se observa é que o volume e a pressão do gás estão vinculados, ou seja, mudando um deles, o outro também mudará. O jeito que essas propriedades mudam foi estudado pelo filósofo e químico irlandês Robert Boyle, em 1661:
A uma temperatura constante, o volume de uma quantidade fixa de gás é inversamente proporcional à pressão.
Dizemos que duas grandezas são inversamente proporcionais quando existe uma relação em que uma delas, ao ser multiplicada por um certo fator, faz com que a outra seja dividida por este mesmo fator.
Vejamos um exemplo: considere 10 L de um gás a uma pressão de 2 atm. Se a pressão desse gás dobrar, passando a ser 4 atm, seu volume cairá para a metade, 5 L. Caso a pressão desse gás caia para a metade, ficando 1 atm, seu volume dobrará, passando a ser 20 L.
Nas três situações acima, é possível verificar que o produto entre pressão e volume é sempre o mesmo:
Isso não é coincidência. Quando duas grandezas são inversamente proporcionais, o seu produto é um valor constante. Assim, podemos dizer que, para numa transformação gasosa isotérmica:
P · V = constante ou\(P_\mathrm{inicial} \cdot V_\mathrm{inicial} = P_\mathrm{final} \cdot V_\mathrm{final}\)
Generalizando, se uma certa massa de gás, num recipiente fechado, é sujeita ao dobro da pressão anterior, o volume do gás passa a ser metade do anterior; se a pressão triplicar, o volume se reduz para um terço; e assim por diante. Essa relação pode ser estendida também para a redução da pressão: se a pressão sobre uma quantidade fixa de gás diminuir para a metade, seu volume passará a ser o dobro; se a pressão cair para um terço, o volume triplicará.
Essa relação pressão–volume em uma transformação isotérmica é chamada de lei de Boyle ou lei de Boyle–Mariotte, nome que leva em conta a descoberta independente pelo físico francês Edme Mariotte em 1679 (apesar de Boyle já ter publicado em 1662).
É possível registrar em gráficos os valores de pressão e volume de uma transformação isotérmica. Ao plotar pressão versus volume, o gráfico obtido tem a forma de um ramo de hipérboleG1, e é chamado de isoterma (Figura F2). Quanto maior a temperatura do gás, mais “longe” da origem fica a isoterma.
Também é possível interpretar a relação entre a pressão e do volume de outra maneira. P é inversamente proporcional a V, o que equivale a dizer que P é diretamente proporcional a
| P (atm) | V (L) | ||
|---|---|---|---|
| 1 | 20 | 0,05 | 1 |
| 2 | 10 | 0,1 | 0,5 |
| 4 | 5 | 0,2 | 0,25 |
(De maneira similar, V também é diretamente proporcional a
Por isso, também é possível plotar a pressão contra o inverso do volume (ou vice-versa), e esse gráfico é uma reta que passa pela origem dos eixos (Figura F3).
Uma demonstração comum em programas de TV que convidam divulgadores científicos é encher uma bexiga de festa com ar, amarrá-la e mergulhá-la em nitrogênio líquido. Como a temperatura cai muito (o nitrogênio só permanece líquido até −196°C), a bexiga começa a murchar e chega até a ficar praticamente amassada, como se fosse uma folha de papel. Ao tirar ela do nitrogênio líquido, ela gradualmente incha e retorna à sua forma original.
Como a bexiga é feita de um material flexível, podemos considerar que a pressão sobre o ar dentro dela é constante, e temos uma transformação que envolve apenas a temperatura e o volume. Ao manter uma quantidade fixa de gás a uma pressão constante, é possível variar sua temperatura ou seu volume; essa manipulação é chamada de transformação isobárica.4
Numa transformação desse tipo, o que se observa é que a temperatura é diretamente proporcional ao volume do gás: ambos aumentam juntos, ou diminuem juntos. O jeito que essas propriedades variam foi estudado pelo cientista e balonista francês Jacques Charles, em 1787.
A Figura F4 mostra um gráfico temperatura versus volume para um certo gás. A linha desse gráfico é uma reta, o que mostra a proporcionalidade, mas ela não passa pela origem dos eixos. Isso é porque a temperatura nesse gráfico está em graus Celsius. Se extrapolarmos a reta até ela chegar no eixo da temperatura (ou seja: volume zero), ela atinge esse eixo na temperatura de −273,15°C, o zero absoluto.
Claro, essa extrapolação é hipotética já que, se o gás resfriasse tanto, ele acabaria voltando a ser líquido e depois sólido. Mas a existência desse “zero absoluto” levou à criação da escala Kelvin de temperatura, em que o zero absoluto equivale à temperatura de zero kelvin (0 K).
Dessa forma, a expressão da lei de Charles fica exatamente correta se considerarmos a temperatura absoluta do gás, em kelvins:
A uma pressão constante, o volume de uma quantidade fixa de gás é diretamente proporcional à temperatura absoluta.
Vejamos um exemplo: considere 10 L de um gás a uma temperatura de 400 K (127°C). Se a temperatura absoluta desse gás dobrar, passando a ser 800 K (527°C), seu volume também dobrará, ficando 20 L. Caso a temperatura absoluta desse gás caia para a metade, ficando 200 K (−73°C), seu volume também cairá pra metade, ficando 5 L. Nas três situações, é possível verificar que a divisão entre volume e temperatura é sempre a mesma:
Assim, podemos dizer que, para numa transformação gasosa isobárica:
\(\dfrac{V}{T}\) = constante ou\(\dfrac{V_\mathrm{inicial}}{T_\mathrm{inicial}} = \dfrac{V_\mathrm{final}}{T_\mathrm{final}}\)
A Figura F5 mostra um gráfico volume versus temperatura absoluta, e agora a reta, ao ser extrapolada, passa pela origem dos eixos.
Desodorantes do tipo aerossol contêm avisos que informam os consumidores de que não se deve expor a embalagem ao sol ou a temperaturas maiores que 50°C, mesmo após o término do produto. Esse aviso está presente porque uma embalagem dessas, mesmo “vazia”, ainda tem pelo menos o gás usado para a propulsão do desodorante. Ao esquentar esse gás contido na embalagem, isso aumenta a pressão dele (ou seja, ele faz cada vez mais força pra sair); se essa pressão continuar aumentando, a embalagem pode estourar violentamente — e, considerando que o gás propelente geralmente é inflamável, esse estouro vem acompanhado de uma baita labareda.
Como a embalagem é de um metal rígido, ela não varia tanto de volume (ao menos em temperaturas razoáveis). Ao manter uma quantidade fixa de gás a um volume constante, é possível variar sua temperatura ou sua pressão; essa manipulação é chamada de transformação isovolumétrica ou isométrica ou isocórica.5
Numa transformação desse tipo, o que se observa é que a temperatura absoluta é diretamente proporcional à pressão do gás: ambos aumentam juntos, ou diminuem juntos. O jeito que essas propriedades variam foi estudado pelo cientista e balonista francês Joseph Louis Gay-Lussac6, na mesma época da lei de Charles.7
A Figura F6 mostra gráficos temperatura versus pressão para um certo gás, com a temperatura em kelvins e em graus Celsius. Da mesma forma que nos gráficos V vs. T de transformações isobáricas, se observam linhas retas, e quando a temperatura está em kelvins, essas linhas podem ser extrapoladas até a origem dos eixos.
Dessa forma, a expressão da lei de Gay-Lussac é:
A um volume constante, a pressão de uma quantidade fixa de gás é diretamente proporcional à temperatura absoluta.
Vejamos um exemplo: considere gás sob pressão de 2 atm a uma temperatura de 400 K (127°C). Se a temperatura absoluta desse gás dobrar, passando a ser 800 K (527°C), sua pressão também dobrará, ficando 4 atm. Caso a temperatura absoluta desse gás caia para a metade, ficando 200 K (−73°C), sua pressão também cairá pra metade, ficando 1 atm. Nas três situações, é possível verificar que a divisão entre pressão e temperatura é sempre a mesma:
Assim, podemos dizer que, para numa transformação gasosa isovolumétrica:
\(\dfrac{P}{T}\) = constante ou\(\dfrac{P_\mathrm{inicial}}{T_\mathrm{inicial}} = \dfrac{P_\mathrm{final}}{T_\mathrm{final}}\)
É possível combinar as três leis empíricas dos gases em uma única relação matemática, que é útil para relacionar pressão, temperatura e volume de uma quantidade fixa de gás em qualquer transformação genérica.
Para deduzir essa relação, vamos imaginar uma transformação genérica: uma massa fixa de gás em condições iniciais com pressão Pinicial, um volume Vinicial e temperatura Tinicial sofre uma transformação, ficando com pressão Pfinal, volume Vfinal e temperatura Tfinal.
Vamos imaginar que essa transformação aconteça em duas etapas, digamos uma isobárica e outra isotérmica:
Da transformação 1, temos que:
Vamos isolar Vmeio na transformação 1 para que possamos sumir com ele na transformação 2:
\(\dfrac{P \cdot V}{T}\) = constante ou\(\dfrac{P_\text{inicial} \cdot V_\text{inicial}}{T_\text{inicial}} = \dfrac{P_\text{final} \cdot V_\text{final}}{T_\text{final}}\)
Além de estudos entre a relação entre pressão, volume e temperatura para quantidades fixas de gases, também houve estudos variando a quantidade de gás.
Em 1808, Gay-Lussac realizou diversas reações entre substâncias gasosas e percebeu que, nas mesmas condições de pressão e temperatura, os volumes dos gases envolvidos nessas reações estavam relacionados por proporções simples.
Por exemplo, na reação entre hidrogênio e oxigênio formando água, é possível medir e verificar que, nas mesmas condições de pressão e temperatura, 2 “volumes” de hidrogênio reagem com 1 “volume” de oxigênio formando 2 “volumes” de água (no estado gasoso). Assim, se 100 mL de hidrogênio reagirem com 50 mL de oxigênio, serão formados 100 mL de água, e assim por diante.
Essa observação é chamada lei da combinação dos volumes ou lei volumétrica de Gay-Lussac:
Os volumes de reagentes gasosos e de produtos gasosos numa reação química podem ser relacionados numa proporção de números inteiros e pequenos.
falta coisa aqui: continuar/ilustrar?
Em 1811, o cientista italiano Amedeo Avogadro propôs uma hipótese que dizia que:
Numa temperatura e pressão constantes, volumes iguais de gases diferentes contêm os mesmos números de moléculas.
Essa hipótese foi importante no desenvolvimento da Química porque fazia uma “ponte” entre a teoria atômica de Dalton e a lei da combinação dos volumes de Gay-Lussac, pela introdução do conceito de molécula.
falta coisa aqui
A partir das leis empíricas das transformações gasosas, é possível perceber relações entre as variáveis de estado de um gás:
Se o volume V é proporcional a
Essa constante de proporcionalidade é chamada de constante universal dos gases, e é simbolizada por R. Usando esse símbolo e reorganizando a igualdade anterior (
PV = nRT
Essa relação é chamada de lei do gás ideal. Um gás que obedeça exatamente essa expressão em qualquer condição é chamado de gás ideal (ou gás perfeito). Agora, caso o gás não siga essa relação à risca (o que, de fato, acontece com qualquer gás na vida real), ele é chamado de gás real; mesmo assim, dá pra usar a lei do gás ideal para gases reais de maneira aproximada.
Para utilizar essa equação, é necessário escolher um valor de R que corresponda às unidades de pressão e volume que você está usando no cálculo (a temperatura sempre entra em kelvins). Os valores mais usados de R são:
R = 8,314\(\mathrm{\dfrac{Pa \cdot m^3}{mol \cdot K}}\) = 0,082\(\mathrm{\dfrac{atm \cdot L}{mol \cdot K}}\) = 62,364\(\mathrm{\dfrac{mmHg \cdot L}{mol \cdot K}}\) valor-exato-R
ExemploUma amostra de 2,0 mol de gás nitrogênio está confinada num recipiente com 20,0 L, a uma temperatura de 25°C. Considerando um comportamento de gás ideal, qual é a pressão dessa amostra de gás, em atmosferas?
ResoluçãoSabemos que n = 2,0 mol, V = 20,0 L e T = 25°C = 298 K. Como a pressão está sendo pedida em atmosferas e o volume está em litros, vamos usar R = 0,082
ExemploCalcule o volume ocupado por 0,625 mol de gás carbônico sob 3,00 atm de pressão e a 27°C.
ResoluçãoSabemos que n = 0,625 mol, P = 3,00 atm e T = 27°C = 300 K. Como a pressão está em atmosferas, vamos usar R = 0,082
ExemploUma amostra de 3,00 mol de um gás ideal está num recipiente com 50,0 L de volume, em uma temperatura elevada. Para baixar a pressão interna do recipiente, ele foi resfriado até que a pressão fosse de 1,50 atm. Qual é a temperatura do recipiente após o resfriamento?
ResoluçãoSabemos que n = 3,00 mol, V = 50,0 L e P = 1,50 atm. Como a pressão está em atmosferas e o volume, em litros, vamos usar R = 0,082
No ==Capítulo X==, nós vimos que é possível determinar quantidades de reagentes e produtos usando estequiometria. Até então, conseguíamos apenas fazer cálculos estequiométricos usando massas e mols. Agora, com gases, é possível usar a lei dos gases ideais para aumentar as possibilidades de cálculos estequiométricos.
Assim como a massa molar é um valor referente à massa de um mol, também existe o volume molar (Vm), que é um valor referente ao volume de um mol de substância. De maneira análoga à massa molar (M = m/n), o volume molar é definido por:
Podemos reorganizar a igualdade acima como
Uma amostra de matéria pode ter um volume molar em qualquer estado — por exemplo, o volume molar da água líquida a 25°C e 1 atm é 18 mL/mol —, mas o volume molar é mais relevante para gases, porque, segundo as leis empíricas dos gases, o volume molar não depende da composição do gás. Ou seja, considerando um comportamento ideal, o volume molar de todos os gases é o mesmo, numa determinada pressão e temperatura.
Existem vários conjuntos de pressão e temperatura que são referências de medida e recebem nomes e siglas, e há um volume molar para cada um. A Tabela resume esses conjuntos.
| Condição | Pressão | Temperatura | Volume molar de gás |
|---|---|---|---|
| Condições normais de temperatura e pressão (CNTP) | 1 atm | 0°C | 22,4 L/mol |
| Condições padrão de temperatura e pressão (CPTP) | 1 bar (100 kPa; 0,987 atm) | 0°C | 22,7 L/mol |
| Condições ambientes | 1 atm | 25°C | 24,4 L/mol |
Evidentemente, é possível calcular o volume molar para qualquer conjunto de pressão e temperatura, basta usar a lei dos gases ideais. Basta aplicar
Tendo um valor de volume molar à mão ou apenas dependendo da lei dos gases ideais, é possível usar volumes de gases em cálculos estequiométricos, de maneira similar à que usamos massas.
ExemploPara obter hidrogênio, uma pessoa reagiu pedaços de zinco com ácido clorídrico:
ResoluçãoO cálculo estequiométrico envolve apenas o zinco e o hidrogênio:
| Zn | + | 2 HCl | → | ZnCl2 | + | H2 |
|---|---|---|---|---|---|---|
| 1 mol | 1 mol | |||||
| ↓ × 65,4 g/mol | ↓ × 22,4 L/mol | |||||
| 65,4 g | 22,4 L | |||||
| 4,91 g | x |
ExemploO carbonato de cálcio, CaCO3, sofre decomposição ao ser aquecido, formando CaO e CO2. Uma amostra de 25 g de CaCO3 foi aquecida e se decompôs completamente. O gás carbônico formado nessa decomposição foi coletado e, após um tempo, tinha temperatura de 37°C e pressão de 1,2 atm. Calcule o volume desse gás nessas condições. (Massas molares, em g/mol: CaCO3 = 100; CaO = 56; CO2 = 44.)
ResoluçãoA equação balanceada da decomposição do carbonato de cálcio é:
O cálculo estequiométrico envolve apenas o carbonato de cálcio e o dióxido de carbono:
| CaCO3 | → | CaO | + | CO2 |
|---|---|---|---|---|
| 1 mol | 1 mol | |||
| ↓ × 100 g/mol | ↓ | |||
| 100 g | 1 mol | |||
| 25 g | x |
O volume de CO2 pode ser calculado pela lei dos gases ideais, considerando n = 0,25 mol; P = 1,2 atm; T = 37°C = 310 K:
Para tentar explicar o comportamento de um gás ideal quanto à sua pressão, volume e temperatura, foi proposto um modelo cinético-molecular, que pode ser resumido da seguinte forma:
falta coisa aqui
Vários materiais que são gasosos não são formados por um gás puro, em vez disso, são formados por misturas de gases. Por exemplo, o ar atmosférico é uma mistura de nitrogênio, oxigênio e argônio, principalmente; para cada 100 L de ar seco e não poluído, 78 L são de N2, 21 L são de O2, 0,9 L são de Ar, e o resto é de outros gases, como o CO2.
Gases diferentes costumam se misturar com facilidade porque, segundo o modelo cinético-molecular de gases ideais, as moléculas desses gases estão afastadas o suficiente e interagem muito pouco umas com as outras. Assim, numa mistura gasosa, cada substância meio que existe de maneira independente.
Vamos imaginar três gases ideais, A, B e C, cada um com sua pressão, volume e temperatura. Ao juntar esses gases, forma-se uma mistura (Figura ).
Numa mistura gasosa, cada componente terá uma pressão parcial (p)p-minúsculo, que é proporcional à quantidade de moléculas daquele componente. Partindo da lei do gás ideal (PV = nRT), e usando a lógica de que cada componente é independente do outro, temos que a pressão parcial de um gás A numa mistura é:
A soma das pressões parciais de todos os componentes da mistura é igual à pressão total dela:
A relação acima é a formulação atual da chamada lei de Dalton das pressões parciais, e é válida tanto para gases ideais quanto para gases reais.
Se expandirmos as pressões parciais, temos:
Podemos comparar a pressão parcial de um gás contra a pressão total, da seguinte forma:
Perceba que a pressão parcial está para a pressão total da mesma forma que a quantidade em mols do componente está para a quantidade total em mols da mistura. Por exemplo, se uma mistura tem 1 mol do gás A e 1 mol do gás B, a fração
A divisão
Assim, podemos dizer que a pressão parcial de um gás A numa mistura gasosa é:
Uma interpretação da pressão parcial, válida apenas para gases ideais, é que a pressão parcial de um gás A numa mistura é a pressão que esse gás exerceria se ocupasse sozinho o mesmo volume que a mistura, sob a mesma temperatura. Inclusive foi assim que John Dalton (o mesmo da teoria atômica) definiu pressão parcial na lei que ele propôs em 1802 — hoje em dia, a definição mais precisa é a da igualdade acima (que também vale para gases não ideais).
ExemploUma mistura contém 0,040 mol de oxigênio e 0,060 mol de gás carbônico, e está ocupando um recipiente fechado com 1,50 L a uma temperatura de 27°C. Calcule as pressões parciais de cada componente da mistura, e a pressão total exercida pela mistura.
ResoluçãoPara o gás oxigênio,
Para o gás carbônico,
A pressão total da mistura é a soma das pressões parciais:
Um balão de hélio flutua no ar. Um balão que a gente enche com o ar expirado dos nossos pulmões afunda no ar. Isso tem a ver com a densidade do gás que está dentro do balão, algo que já tratamos na Unidade A.
A densidade é a massa dividida pelo volume (d = m/V), mas obter a massa de um gás pode ser uma tarefa um pouco complicada. Podemos usar a lei dos gases ideais para calcular a densidade de um gás com base em outros parâmetros.
A lei dos gases ideais não envolve massa, mas envolve quantidade de matéria (n), ou seja, quantos mols de gás há na amostra. A relação entre mols e gramas é n = m/M, em que M é a massa molar do gás, em gramas por mol. Juntando essa relação com a lei do gás ideal, temos:
Perceba que, se estabelecermos uma pressão e uma temperatura específicas, podemos comparar as densidades de dois gases apenas se baseando nas massas molares:
Também é possível usar essa relação para comparar densidades de diversos gases com a do ar. O ar não é uma substância única, então a “massa molar” dele é um valor médio. Considerando que, em volume, 78% do ar é N2 (28 g/mol), 21% é O2 (32 g/mol) e 1% é Ar (40 g/mol), é possível deduzir que a “massa molar” média do ar é 28,96 g/mol. Assim, gases com massa molar menor que essa flutuam no ar (por exemplo: H2, He), e gases com massa molar maior que essa afundam no ar (por exemplo: O2, CO~2).
ExemploCalcule a densidade do xenônio (M = 131,29 g/mol) sob pressão de 1,5 atm e temperatura de 27°C. Diga se o xenônio afunda ou flutua no ar, na mesma pressão e temperatura.
ResoluçãoP = 1,5 atm; M = 131,29 g/mol; R = 0,082
Considerando as mesmas condições de pressão e temperatura, podemos deduzir que o xenônio afunda no ar, já que a massa molar dele é maior que a massa molar média do ar (28,96 g/mol).
Comparando gases diferentes nas mesmas condições de temperatura e pressão, vemos que a massa molar é que determina qual é mais denso. Mas, se tivermos o mesmo gás em condições diferentes, aí é a temperatura e a pressão que influenciam na densidade. Analisando a equação de densidade dos gases, podemos ver que:
A relação da densidade com a temperatura pode ser exemplificada pelo ar atmosférico: ar quente sobe, ar frio desce. É por causa disso que balões de ar quente conseguem voar, e também por isso que existem as brisas marítima e terrestre, dentre outros fenômenos atmosféricos.
Exemplo Calcule a densidade do nitrogênio (M = 28 g/mol) nas seguintes condições: a) 20°C e 1,0 atm b) 40°C e 1,0 atm c) 20°C e 0,5 atm
ResoluçãoPara todos os itens, M = 28 g/mol e R = 0,082
a)
b)
c)
Se uma pessoa estiver num canto de uma e sala, sentir um desconforto e acabar soltando um… flato… é bem possível que uma outra pessoa, em outro canto da sala, sinta algum cheiro desagradável, dependendo da força e da potência do ato.
Gases tendem a se espalhar espontaneamente, se não estiverem confinados em um recipiente, num processo chamado difusão. A difusão acontece naturalmente, e tende sempre a “homogeneizar” um sistema, ou seja, equilibrar as concentrações de gases.
Gases podem se espalhar através de pequenos orifícios. Quando você compra um balão com gás hélio, ele flutua no ar, mas não para sempre. Basta alguns dias para ele afundar — isso acontece porque o hélio saiu do balão por pequenos orifícios no látex da bexiga, deixando ar entrar. Quando gases atravessam pequenos furos, dizemos que está ocorrendo uma efusão.
O químico escocês Thomas Graham observou, experimentalmente, que a velocidade de efusão de um gás é inversamente proporcional à raiz quadrada da massa molar dele:
Ou seja, quanto mais pesadas as moléculas de um gás, menor é a velocidade de efusão. Mas não numa relação tão linear: um gás com massa molar 40 g/mol não tem metade da velocidade de efusão que um gás com massa molar 20 g/mol — a raiz quadrada ali interfere nisso.
Para vermos melhor como comparar a velocidade de efusão de dois gases, vamos reescrever a relação acima como uma igualdade:
Assim, para dois gases A e B:
Podemos dividir uma igualdade pela outra, assim teremos uma comparação entre as velocidades de efusão. Fazendo isso, a constante é cancelada, e temos:
A relação acima é chamada de lei de Graham. Vamos aplicá-la ao exemplo anterior. Se o gás A tem massa molar 40 g/mol e o gás B tem massa molar 20 g/mol, podemos concluir que:
O gás A, que tem o dobro da massa molar de B, tem 71% da velocidade de efusão, ou seja, é mais lento para atravessar orifícios.
Vale dizer que as relações vistas até agora consideram que ambos os gases têm a mesma pressão e temperatura.
falta coisa aqui
Até agora, nós consideramos gases ideais nas abordagens, explicações e exemplos. A relação
Gases reais têm certos desvios das condições ideais que estudamos até agora, porque as moléculas de gás têm sim interações umas com as outras, o que causa alguns efeitos adicionais que não vimos até agora.
Mesmo na vida real, é possível usar aproximações de gases ideais (como a lei do gás ideal) quando a pressão do gás real é bastante baixa. Agora, gases em altas pressões e/ou em baixas temperaturas têm comportamentos que desviam bastante do ideal, porque nesses casos, a interação entre as moléculas é aumentada.
falta coisa aqui