Os átomos são coisas muito pequenas. Muito, muito, muito pequenas. Por causa disso, algumas propriedades deles são difíceis de expressar em unidades comuns.
A massa de um átomo de hidrogênio é 1,67 × 10−27 kg. Agora, pra comparar, esta é a massa de um átomo de oxigênio: 2,66 × 10−26 kg.8
Ok, são números pequenos… Pequenos demais até, a ponto de não ser muito conveniente usar esses valores. Se você consultar uma tabela periódica e procurar a massa de um átomo de hidrogênio, você não vai encontrar 1,67 × 10−27 kg, mas vai encontrar algo como “1,008”.
Tipicamente, em Química, nós expressamos as massas dos átomos de maneira relativa a algum átomo específico; quando os químicos lá do século 18 começaram a observar as massas dos elementos que participavam de reações químicas, começaram a fazer comparações entre elas, antes mesmo do Dalton propor que as coisas são feitas de átomos.60 Ao longo da história da Química, a referência para expressar as massas dos átomos foi mudando: já foi um átomo de hidrogênio, já foi um átomo de oxigênio, mas atualmente é um átomo de carbono — especificamente o carbono-12, um átomo que tem 6 prótons, 6 nêutrons e 6 elétrons.
Massa atômica (MA)1 é a massa de um átomo (que surpresa!), tipicamente expressa em unidades de massa atômica. A unidade de massa atômica (u)2, ou o dalton (Da), é uma unidade atualmente definida como
Em princípio, a massa atômica é uma propriedade de um átomo específico: por exemplo, o hidrogênio-1 (1H) tem massa atômica 1,0078 u; o oxigênio-16 (16O) tem massa atômica 15,9949 u; o carbono-12 (12C) tem massa atômica 12 u, exatamente.
É possível estabelecer comparações a partir desses valores. Por exemplo, mesmo sem saber a massa (em quilogramas) dos átomos de 12C e 16O, sabemos que um átomo de oxigênio-16 tem
Acontece que é bem comum e útil considerar uma massa atômica média de um elemento químico, levando em conta os isótopos dele: faz-se uma média ponderada das massas atômicas de cada isótopo, considerando as abundâncias percentuais deles numa amostra.
Por exemplo, o elemento químico boro tem dois isótopos estáveis:
A massa atômica do elemento boro então, é:
Ou seja, se em alguma situação for necessária a massa de um átomo “genérico” de boro, em que não importa o isótopo, usa-se esse 10,81 u.
As massas atômicas dos elementos químicos são encontradas na tabela periódica, com uma pequena diferença: elas aparecem sem unidade. Nesse caso, elas são chamadas de massas atômicas relativas3. É útil não escrever a unidade porque esses mesmos valores também são usados em Química com outras unidades além da unidade de massa atômica.
Para trabalhos com grande precisão, é necessário um rigor maior. Algumas versões recentes da tabela periódica da IUPAC consideravam, para alguns elementos, um intervalo de massas atômicas relativas. Isso ocorre porque em materiais comuns, as abundâncias dos isótopos desses elementos variam de maneira considerável e bem conhecida. Por exemplo, o lítio aparecia com duas “massas atômicas relativas”: o intervalo [6,938; 6,997] (ou seja, o valor podia variar entre 6,938 e 6,997) e um valor “convencional”, menos preciso: 6,94. A versão mais recente da tabela, até então (de maio de 2022), unificou isso exibindo todas as massas atômicas como um valor com uma incerteza; por exemplo, a massa atômica do lítio é mostrada como 6,94 ± 0,06 (ou seja, pode variar entre 6,88 e 7,00).20
As massas atômicas são usadas para calcular as massas de moléculas (massas moleculares, MM) e de fórmulas unitárias de substâncias iônicas (massas fórmula, MF)4: em ambos os casos, a massa da molécula ou da fórmula unitária é a soma das massas atômicas de todos os átomos presentes na fórmula. Por exemplo:
Apesar de íons não serem átomos neutros, a diferença de massa causada pela falta ou excesso de elétrons é desprezível para os nossos propósitos aqui (a massa de um elétron é aproximadamente 0,0005 u). Então vamos considerar a massa do Na+ “igual” à do Na, a do Cl− “igual” à do Cl, etc.
Como dito na seção anterior, átomos (e íons e moléculas) são coisas muito, muito, muito pequenas. É difícil contar e pesar átomos ou moléculas individuais. Foi necessária uma estratégia pra saber quantos átomos tem numa certa amostra de substância.
Considere o conceito de “dúzia”. Uma dúzia é um conjunto com 12 coisas, independentemente do que sejam essas coisas.
Em Química existe um conceito semelhante: o mol. Um mol de “coisas” é um conjunto com um certo número fixo de “coisas” — essas coisas são átomos, moléculas, íons, etc. Esse número fixo é chamado de número de Avogadro, e tem o singelo valor de 602.214.076.000.000.000.000.000 ou 6,02214076 × 10239, daqui em diante arredondado para 6,02 × 1023:
1 mol de coisas = 6,02 × 1023 coisas
Também dá pra juntar uma unidade de medida nesse número e aí nós temos a constante de Avogadro (NA), que é mais usada em cálculos: NA = 6,02 × 1023 mol−1. (Essa unidade mol−1 é um jeito de dizer “por mol”: existem 6,02 × 1023 [“coisas”] por mol.)
O número de Avogadro é absurdamente gigantesco. É uma ordem de grandeza inconcebível pro nosso cerebrozinho medíocre entender completamente, porque é impossível existir essa quantidade de alguma coisa macroscópica. Se compreender a grandeza de um milhão (106) e um bilhão (109) já é difícil, imagine mais que um sextilhão (1021).7
Então o mol só tem sentido se for referente a átomos, moléculas, íons, fórmulas iônicas… coisas dessa escala de tamanho minúscula, geralmente chamadas de entidades elementares.
O motivo de um mol ser esse número grotesco de coisas (em vez de, digamos, um milhão ou um bilhão) é porque essa quantidade é conveniente para os químicos, principalmente no que diz respeito a quanto pesa um mol de alguma coisa.
Vamos considerar o isótopo carbono-12 como exemplo, antes de generalizar. Um átomo de carbono-12 pesa exatamente 12 u (por causa da definição da unidade de massa atômica). Um mol de átomos de carbono-12 é exatamente a quantidade desses átomos, que juntos, pesam 12 gramas — e essa quantidade de átomos é 6,02 × 1023. Ou seja:
Essa repetição do 12 ali não é coincidência. Um mol de coisas vai ter uma massa numericamente igual à massa da coisa sozinha: se a coisa pesa “tantos u”, um mol dessa coisa vai pesar o mesmo “tanto”, só que em gramas.6 Por exemplo:
É comum nós encurtarmos expressões como essas e dizermos apenas “um mol de H”, “um mol de H2O” e “um mol de NaCl”; só é bom tomar cuidado com ambiguidades: por exemplo, “um mol de hidrogênio” pode significar tanto “um mol de H” quanto “um mol de H2” se não houver contexto suficiente.
O mol é tratado como uma unidade de medida (símbolo: mol), e é uma das sete unidades básicas do SI. Quando uma quantidade de entidades elementares está especificada em mols ela é considerada a grandeza quantidade de matéria ou quantidade de substância (n). Por exemplo, se nós tivermos dois mols de água, podemos dizer que n = 2 mol de H2O ou n(H2O) = 2 mol.5
Ok, mas… por quê? Pra que isso de mol?
Em reações químicas, é fundamental saber quanto de cada reagente vai reagir, sem sobrar nada. Se uma equação química me diz, por exemplo, que duas moléculas de H2 reagem com uma molécula de O2 pra formar duas moléculas de água (ou seja, 2 H2 + O2 → 2 H2O), então eu posso deduzir quanto de cada material está envolvido numa reação dessa.
A massa molecular do H2 é 2,0 u, a do O2 é 32,0 u, e a da H2O é 18,0 u, portanto 4,0 u de H2 reagem completamente com 32,0 u de O2 formando 36,0 u de água… o que é muito bacana, mas não ajuda tanto assim a saber quanto pesar dessas coisas se eu quiser executar essa reação na vida real, com muito mais moléculas.
Mas a lei das proporções definidas nos permite concluir, a partir dessas massas em “u”, que (de acordo com as proporções das massas) 4,0 gramas de H2 reagem completamente com 32,0 gramas de O2 formando 36,0 gramas de água. Os mesmos valores das massas moleculares, só que em gramas. Não é coincidência, é proporção matemática.
Considerando que relações em gramas são muito mais práticas num laboratório (afinal dá pra medir as quantidades com uma balança), convencionou-se dizer que a quantidade de uma substância que pesa “a massa molecular (ou atômica, etc.), só que em gramas” seria um mol dessa substância. Na verdade essa era mais ou menos a definição anterior do mol (até 2019): “o mol é a quantidade de substância de um sistema que contém tantas entidades elementares quantos átomos existem em 0,012 kg de carbono-12”, ou seja: 12 g de 12C = 1 mol de 12C (cuja massa atômica é 12 u).
Um jeito formal de unificar isso de “a massa atômica/molecular/fórmula, só que em gramas” é a grandeza massa molar (M): um valor, tipicamente em gramas por mol (g/mol), que expressa a massa de um mol de alguma coisa. Basicamente, se a massa de 1 mol de uma coisa é “tantos gramas”, a massa molar dessa coisa é “tantos gramas por mol”:
Perceba que a “coincidência” de números continua: o “número” da massa molar é igual ao “número” de quanto pesa um mol, que é igual ao “número” de quanto pesa um átomo/molécula/etc.:
O bom do nome “massa molar” é que ele não se apega ao tipo de entidade elementar (ao contrário das expressões “massa atômica”, “massa molecular” e “massa fórmula”).
Sabendo a massa molar de uma substância, é possível converter a massa de uma amostra dessa substância numa quantidade em mols. Por exemplo: um copo contém 180 g de água. Quantos mols de H2O há nesse copo?
A massa molar da H2O é 18,0 g/mol (caso você ainda não tenha percebido durante esse capítulo). Dessa forma, 18,0 g de H2O = 1 mol de H2O. Como massa e mols são proporcionais (se eu tiver 2 mols de H2O terei 2 · 18,0 g, etc.), podemos fazer uma regra de três:
x =
Ou seja, há 10 mol de H2O em 180 g.
Regras de três como essa podem ser resumidas numa relação matemática:
quantidade de matéria =\(\dfrac{\text{massa}}{\text{massa molar}}\) ou n =\(\dfrac{m}{M}\)
Ou num esqueminha:
E quantas moléculas de H2O há em 180 g de água?
Bem, considerando que essa quantidade é 10 mol de água, e que cada mol de água equivale a 6,02 × 1023 moléculas de H2O, em 180 g há 10 · 6,02 × 1023 = 6,02 × 1024 moléculas de água.10
Ou seja, em um copo de água há 6 septilhões de moléculas.
Eu disse que elas eram pequenas.
Substâncias são materiais com propriedades bem definidas e composições fixas. Para informar a composição de uma substância química (o que tem nela e quanto tem), usamos fórmulas químicas. Existem vários tipos de fórmulas químicas e o uso delas depende do que queremos informar:
Para ilustrar essas fórmulas, vamos considerar uma substância molecular contendo os elementos carbono, hidrogênio e oxigênio. Uma análise química mostrou que 50,0 g dessa substância contêm 20,0 g de carbono, 3,3 g de hidrogênio e 26,7 g de oxigênio.
A composição percentual dessa substância é obtida calculando as porcentagens em massa desses elementos:
Sendo assim, poderíamos escrever uma fórmula percentual dessa substância: C40,0%H6,6%O53,4%.
Para ter uma noção da fórmula mínima podemos transformar as massas dos elementos em mols. Considerando que a massa molar do C é 12,0 g/mol, a do H é 1,0 g/mol e a do O é 16 g/mol:
Essa é a proporção C : H : O, em mols, dessa substância. Uma fórmula mínima mostra a menor proporção entre mols dos elementos usando números inteiros. Para obter isso rapidamente, um jeito é dividir todos esses valores em mols pelo menor deles:
1,67 mol C : 3,3 mol H : 1,67 mol O =
Considerando os arredondamentos feitos, a precisão dos dados, e possíveis erros experimentais, podemos considerar que aquele 1,98 mol de H é basicamente igual a 2 mol de H. Dessa forma, a menor proporção inteira em mols dos elementos dessa substância é expressa pela fórmula mínima CH2O.
Significa que cada molécula dessa substância tem exatamente um átomo de C, dois de H e um de O? Talvez. Precisamos de mais informações sobre a molécula. Por enquanto só podemos deduzir que para cada átomo de C, tem dois de H e um de O.
Agora, coincidentemente, considere que acabou de chegar uma análise dessa substância que mostra que a massa molecular dela é 180,0 u. Juntando essa informação com a fórmula mínima CH2O, podemos achar a fórmula molecular.
Se a fórmula mínima da substância é CH2O, a fórmula molecular dela pode ser CH2O, C2H4O2, C3H6O3, ou qualquer outro múltiplo da fórmula mínima. A massa molecular da fórmula mínima CH2O é 1 · 12,0 + 2 · 1,0 + 1 · 16,0 = 30,0 u. A massa molecular da substância é 180,0 u, e esse valor é 180,0 ÷ 30,0 = 6 vezes a massa molecular da fórmula mínima. Dessa forma, a fórmula molecular vai ser “6 vezes” a fórmula mínima: 6 × CH2O = C6H12O6.
(Apenas como conferência, a massa molecular de uma substância com fórmula molecular C6H12O6 é 6 · 12,0 + 12 · 1,0 + 6 · 16,0 = 180,0 u. Confere.)
Para descobrir como os átomos estão ligados nessa substância (e, com isso, a fórmula estrutural), podem ser feitas outras análises, como espectroscopias e ressonâncias magnéticas. Essas análises retornam alguns gráficos dos quais se pode deduzir as ligações feitas pelos átomos da molécula. (Ainda não temos bagagem suficiente para discutir esses tipos de técnicas neste livro.)